UM 
              PASSO À FRENTE E VOCÊ NÃO ESTÁ MAIS NO MESMO LUGAR. 
            chico 
              science 
             
               Pensar 
              em uma estratégia é pensar em buscar um objetivo, trazer através 
              de uma escolha uma intenção, ou poderíamos até mesmo pensar em estratégia 
              como a possibilidade de conduzir ações para um fim específico. Em 
              situações decisivas, a estratégia tenta dar conta de objetivos e 
              necessidades, ela se coloca como um plano para uma determinada ação, 
              uma configuração ativa. 
              
                  Pode parecer estranho tentar pensar em uma resposta 
              para o que possa ser estratégia, ou ainda a estratégia da suspensão, 
              principalmente dentro do contexto das artes plásticas. Contudo, 
              me parece necessário pensar a respeito disto, para dizer que naturalmente 
              a posição das coisas é junto do chão, ou pelo menos junto de algum 
              anteparo que seja o "chão" em dada circunstância. Digo isto porque 
              existem coisas, objetos, construções, corpos, que justamente não 
              tocam o chão, são como criaturas fantasmáticas, que dialogam com 
              o ar que as envolve, inseridas numa outra realidade, possível graças 
              a uma estratégia. 
              
                  Uma sala tem o espaço das suas paredes, do seu 
              chão, do seu teto, e do ar que preenche todo e qualquer espaço. 
              Neste lugar, um corpo que paira entre o teto e o chão, junto com 
              o ar, pode ser visto como o invasor de um campo incomum, sobretudo 
              a nós acostumados à gravidade como parâmetro existencial. Assim, 
              se algo pende, equilibra-se no ar, é porque há uma tensão em jogo, 
              uma in (tensão), capaz de articular uma realidade diferente 
              da nossa a partir da estratégia da suspensão. 
              
                  É preciso deixar claro que me interessa pensar 
              esta intenção, esta estratégia, como uma estratégia em arte, como 
              uma configuração ativa. Este procedimento pode ser pensado assim, 
              como uma configuração ativa, por sua capacidade em incorporar o 
              ambiente à sua volta, re-significando-o, simplesmente porque quando 
              estas obras estão suspensas, uma potencialidade lhes é atribuída. 
              Como elaborações que incorporam a dinâmica do objeto de arte, elas 
              se apresentam diferentes de nosso corpo, talvez mais frágeis, talvez 
              mais fortes, mas sobretudo distintas. 
              
                  É possível dizer que algo que cai sobre nós, 
              diante de nós, pode ser percebido como aquém ou além de nossa realidade. 
              Neste agenciamento entrecruzam-se espaço e tempo realmente suspensos. 
              Adiadas as forças da gravidade, instaura-se um campo que joga com 
              a realidade, desafiando-a e remodelando-a. 
              
                  A arte contemporânea, que traz principalmente 
              através de suas obras uma abordagem mais direta com quem a observa, 
              contribui com esta estratégia, pontuando-a particularmente. Diz 
              Tadeu Chiarelli (1997:01) ao comentar a respeito do que as obras 
              contemporâneas "comunicam": "[...] em primeiro lugar é a própria 
              presença delas mesmas, uma presença constituída de materiais e formas 
              articuladas, à procura de um significado final que apenas o espectador 
              - e cada um particularmente - pode dar, a partir de sua própria 
              experiência de estar frente à obra, ou mesmo dentro dela (caso das 
              instalações)." 
              
                  A partir destas palavras, e considerando as articulações 
              possíveis a um trabalho de arte, reafirmo a idéia de suspensão como 
              estratégia, que pretende uma ordem de relações, estabelecidas instantaneamente 
              pelo espectador e percebidas como distintas das de outros objetos 
              que guardam uma relação fixa com o chão, re-orientando conceitos 
              ligados à própria percepção deste espectador. 
              
                  Dentro de uma perspectiva que 
              dialoga com o passado, é possível até mesmo pensarmos na suspensão 
              como um procedimento antecedido por várias rupturas, entre elas 
              as investigações da própria pintura com a parede, da pintura com 
              a escultura, do plano com o espaço, do corpo do espectador com o 
              objeto de arte, entre outras.(Nota_1) Estas 
              rupturas não só possibilitaram uma relação mais intensa para o artista 
              e o seu trabalho junto do espectador, inseridos em um determinado 
              espaço, como também de certa forma reafirmam que, diante das possibilidades 
              que estas rupturas proporcionaram, um trabalho só será construído 
              conforme as necessidades que ele aponta. Assim a suspensão torna-se 
              uma estratégia única e necessária, legitimada por uma atitude crítica, 
              que ultrapassa uma ingênua variação espacial. 
            
               É 
              a partir desta idéia então, a suspensão vista como uma estratégia 
              pontual em arte, que este texto se orienta. Para tanto, tentei organizar 
              algumas observações, alguns aspectos, que permitissem uma reflexão 
              a respeito do gesto de suspender. Partindo sobretudo de um olhar 
              curioso, pontuei Contigüidade, Espaço Interno, Cumplicidade, Tensão, 
              Materialidade e Tempo, como possíveis caminhos para se pensar a 
              suspensão especificamente. 
            Contigüidade 
              
               Talvez 
              seja difícil falar de arte hoje através de categorias fixas: pintura, 
              escultura, gravura, desenho, vídeo... dado que já não existem atualmente 
              fronteiras rígidas entre estas linguagens. É pertinente dizer que 
              estes limites encontram-se freqüentemente borrados. Aliás, já faz 
              algum tempo que determinadas manifestações artísticas, foram anexadas 
              a categorias existentes, como tentativa de entendimento para novos 
              procedimentos, o que acabou por expandir seus conceitos, assunto 
              discutido por Rosalind Krauss em seu texto "A Escultura no Campo 
              Ampliado" (1985:83), onde ela reflete, 
              
              Entretanto, o que parece ser eclético sob um ponto 
              de vista, pode ser concebido como rigorosamente lógico de outro. 
              Isto porque, no pós-modernismo, a práxis não é definida em relação 
              a um determinado meio de expressão - escultura - mas sim em relação 
              a operações lógicas dentro de um conjunto de termos culturais para 
              o qual vários meios - fotografia, livros, linhas em paredes, espelhos 
              ou escultura propriamente dita - possam ser usados. 
              
                 Neste sentido, quando o título deste artigo fala 
              em "A estratégia da suspensão: uma relação da escultura contemporânea 
              com o espaço", não se trata de propor uma reflexão em torno de uma 
              categoria pensada de forma rígida, com modelos prévios, como se 
              fosse possível em arte lidar com limites estabelecidos, mas sim, 
              trata-se de propor uma reflexão em torno de construções suspensas 
              discutidas a partir de algumas características que antes realmente 
              diziam respeito apenas à escultura, como massa, peso, volume e relação 
              com a gravidade. É importante salientar que estas características 
              estão sendo vistas, neste texto, como qualidades que podem ou não 
              estar dadas em um grau máximo - muito peso ou massa exagerada - 
              condições historicamente anteriores para escultura à discussão a 
              que me proponho. Aqui, estas características devem ser vistas como 
              possíveis de irem de um extremo ao outro, ou seja, - a qualidade 
              peso pensada como muito leve ou a qualidade massa, pensada também 
              como o que é sutil- se colocando sob esta direção os dois extremos 
              como legítimos para esta elaboração. 
              
                  É neste contexto que trabalhos ligados indiscutivelmente 
              à tridimensionalidade, sem interessar como poderiam ser classificados, 
              aparecem como possibilidades mais próximas para esta reflexão. 
              
                  Diante destas qualidades de massa, peso, volume 
              e suas conseqüentes relações com a gravidade, a questão das categorias 
              aparece generalizada aqui sob o termo amplo de escultura. Pensando 
              este termo sob um aspecto de contigüidade, em que o fundamental 
              é uma relação mais intensa com o espaço. 
              
                  Quando William Tucker (1999:145) fala de gravidade, 
              ele coloca as coisas da seguinte maneira; "A gravidade une escultura 
              e espectador numa dependência e resistência comum à atração exercida 
              pela terra. Os materiais e a estrutura, o volume e o espaço, a unidade 
              e as proporções da escultura não falam por si mesmos, mas articulam 
              uma percepção complexa e profunda do nosso próprio estar no mundo." 
              
              
                  Pensando sob este aspecto o chão possui uma relação 
              direta com a escultura, uma proximidade imediata, seja porque a 
              peça encontra-se posta sobre ele ou seja porque existe algum elemento 
              que articula uma altura ou um apoio para esta peça, ou ainda, porque 
              o chão é tomado por elementos que o recobrem, investindo nele o 
              sentido do próprio trabalho. 
              
                  Contudo, não será a "presença" do chão, vista 
              sob uma outra necessidade, como acontece no caso da suspensão, que 
              irá abalar as possibilidades de investigações poéticas que lidem 
              desta outra maneira com este peso, este volume, esta massa e ainda 
              com a própria gravidade. 
              
                 No entanto, se - como dizia Tucker no trecho acima 
              - "A gravidade une escultura e espectador numa dependência e 
              resistência comum [...]", o fato de liberar o chão como apoio 
              irrestrito não desfaz necessariamente esta relação que implica obra, 
              espaço e espectador; altera-se sim, a percepção que se pode ter 
              deste objeto e ainda potencialmente alteram-se suas características. 
              
              
                  Se o termo contigüidade prevê uma relação de 
              adjacência ou aproximação, o fato de a obra não tocar o chão, mas 
              sim pousar paralelamente sobre ele, perpetua da mesma forma este 
              aspecto, ou ainda acentua-o por criar um espaço inquieto entre a 
              obra e o chão, reapresentando-o de maneira tão ou mais ativa do 
              que antes. 
            
             
              
              Espaço 
              Interno 
              
                  Pensando o objeto suspenso sob uma análise mais 
              crítica, é possível abordá-lo como um objeto dependente do espaço, 
              tendo na sua lógica a necessidade de um ponto de partida para se 
              estruturar. A questão que orienta este tópico se evidencia através 
              da seguinte pergunta: Como suspender alguma coisa, seja ela qual 
              for, se não houver um ponto de partida para sustentá-la? 
              
                  É neste sentido, diante desta relação, que se 
              faz coerente pontuar um Espaço Interno em que o trabalho suspenso 
              se coloque. Este espaço pode ser fechado, uma peça dentro de um 
              prédio, ou aberto, uma fachada que avance para a rua, como uma marquise, 
              por exemplo. Porém, independentemente desta variação, aberto/fechado, 
              este espaço é imprescindível para possibilitar a resolução do trabalho, 
              garantindo esta configuração aérea. 
              
                  Esta característica é crucial 
              quando pensada em comparação com trabalhos que estão dados a partir 
              do chão, podendo ser dispostos em qualquer lugar, incluindo grandes 
              áreas abertas ou desertas, sem construções próximas, o que torna 
              possível dizer que estes são trabalhos que tem um caráter autônomo 
              quanto a sua estruturação. (Nota 2)
              
                 Diante deste aspecto o trabalho 
              suspenso precisa do interior dos ambientes para instalar-se, pendendo 
              do teto (Nota 3) que este interior lhe oferece. 
              Portanto, é devido a esta urgência que se coloca, que 
              se pode falar em cumplicidade, uma relação estabelecida 
              entre a obra e o ambiente.
            
            Cumplicidade
              
                  Diante de um trabalho suspenso, reconhecemos 
              não só a parte física do trabalho, de maneira 
              pontual, mas nos sentimos convidados a incorporar o teto, e o chão 
              como um todo para esta construção, o que permite falar 
              em um percurso para a apreensão da obra. Pensar um percurso, 
              estabelece um espaço perceptível a ser percorrido, 
              não estou discutindo direções, apenas o percurso 
              em que o espectador, depois de apreender a imagem total do ambiente, 
              percebe as partes reconstituindo um todo.
              
                  Dentro desta idéia em que o teto, por 
              sustentar, e o chão, por ser nossa referência como 
              limite para a atuação da gravidade, estão comprometidos, 
              é que me parece pertinente pensar a possibilidade de empregar 
              a palavra cúmplice para refletir a respeito deste tipo de 
              construção espacial, o objeto suspenso.
              
                 Portanto, um trabalho que articula a estratégia 
              da suspensão como possibilidade aérea, permite fazer 
              com que automaticamente o teto e o chão e ainda a distância 
              que separa estes extremos do corpo do trabalho, sejam seus cúmplices, 
              colocando-os como participantes desta obra, isto porque, é 
              impossível ver que algo pende, sem pensarmos o que o sustenta, 
              tendo em vista o fato de que a gravidade torna reconhecível 
              a estabilidade das coisas através de uma relação 
              de apoio, o que faz com que consequentemente busquemos uma resposta 
              para esta equação de sustentação, de 
              equilíbrio.
              
                  Tratando-se de um objeto dado no campo das artes 
              plásticas, esta equação não se resolve 
              apenas ao descobrirmos que tipo de material sustenta o trabalho, 
              ou a partir de que parte do ambiente ele cai, a investigação 
              neste caso, vai muito além, pois incorpora determinantemente 
              o local de onde ele parte, criando relações. Não 
              há como não estabelecermos um diálogo, por 
              assim dizer, com este teto. O fio que sustenta o trabalho, ou o 
              próprio trabalho quando não há um fio intermediando, 
              "brota" deste teto, não sendo possível então 
              separá-lo da obra.
              
                  Nesta mesma direção, o chão 
              é um elemento que pode estar em contato com o trabalho (tangenciando-o, 
              sem sustentá-lo), ou simplesmente sem estabelecer nenhum 
              contato. Quando não há este contato, o espaço 
              percebido sob o trabalho cria um campo de tensão, que rigorosamente 
              é tido como parte integrante do percurso investigativo, ou 
              seja, do espaço da obra.
              
                  Assim, o procedimento da suspensão 
              torna o espaço à sua volta seu cúmplice, dado 
              que o trabalho está inserido dentro deste espaço. 
              O espaço da obra e o espaço do mundo tornam-se deste 
              modo, um espaço comum, ou como Tassinari (2001:91)(Nota 
              4) afirma, "Um espaço em obra possui uma espacialidade 
              imanente ao mundo em comum. Não o transcende, apenas traça 
              pontes para uma experiência estética que vai do mundo 
              ao próprio mundo."
              
                 É possível dizer então que 
              o trabalho que está suspenso, vai estabelecendo cumplicidade 
              a partir de sua natureza situada no espaço entre os limites 
              do ambiente que o acolhe.
            
            Tensão
              
                 Considerando a relação que temos 
              com o chão, devido ao aspecto gravitacional, é possível 
              dizer que existe uma relação que perpassa neste gesto 
              de suspender, por uma idéia de equilíbrio ou ainda 
              por uma estabilidade precária, posto que há uma força 
              que está sendo contrariada. 
              
                  Ao fazer do ambiente seu cúmplice, devido 
              a sua disposição articulada, o trabalho suspenso lida 
              com os limites dados por este ambiente, ocupando e tensionando este 
              espaço. A partir do trabalho, o espectador, reconhece o espaço 
              como parte dele, justamente devido a esta tensão.
              
                  Esta construção, o objeto suspenso, 
              apresenta além da tensão, diferentes níveis 
              de intensidade, dado que as variações de massa, peso, 
              volume e as possíveis relações com a gravidade, 
              contribuem para apontar o estranhamento existente em situações 
              que temos como improváveis, ou seja, cotidianamente as coisas 
              não estão no ar. É neste sentido que fios muito 
              finos, volumes mais pesados, elementos mais ou menos próximos 
              ao chão ou o uso de materiais que refletem o ambiente, entre 
              outras combinações, podem intensificar ainda mais 
              este procedimento.
              
                  È possível apontar portanto, a 
              tensão como um movimento recíproco: o trabalho pende 
              contrariando a gravidade, tensionando o espaço que ocupa, 
              jogando com os seus limites, por sua vez o espectador atento, que 
              procura posicionar-se diante do que vê, re-elabora seus conceitos 
              de estabilidade. Este espectador tenta dar conta do que está 
              posto diante dele ou sobre ele, ainda percebendo-se sempre numa 
              situação potencialmente distinta da que o objeto implicado 
              lhe apresenta.
            
            Materialidade
              
                  No momento em que algo é suspenso, sua 
              materialidade é evidenciada, visto que neste gesto, há 
              um deslocamento gravitacional que reorganiza a atenção 
              do espectador.
              
                  A partir desta situação, nossa 
              percepção investiga de maneira mais explícita 
              o material que se apresenta, através desta construção 
              suspensa, considerando que ela está dada como um negativo 
              do corpo de quem observa, negativo no sentido em que o nosso corpo 
              depende do chão, assim, um outro corpo que cai diante de 
              nossos olhos, compartilhando de maneira oposta do espaço 
              em que nos encontramos, inquieta-nos, através da questão 
              que envolve a possibilidade dele estar ali.
              
                  Neste momento, este reconhecimento material conduz 
              a uma elaboração mais clara a respeito do trabalho.
              
                  As características destes materiais estarão 
              intimamente ligadas às necessidades que o trabalho impõe, 
              ou como aponta Katia Canton (2001:30), discutindo as escolhas imbricadas 
              no processo de elaboração de um trabalho atualmente. 
              "Um elenco complexo e sofisticado de suportes e possibilidades 
              matéricas se abre naturalmente aos artistas, que substituem 
              essa preocupação com o meio por uma outra ligada ao 
              sentido."
              
                  É nesta direção, que os 
              materiais são um ponto evidente, selecionados com suas características 
              de peso, massa, volume e relação com a gravidade, 
              pontos abordados neste texto, além de outras características, 
              como as possibilidades de configuração, o potencial 
              metafórico, o reconhecimento afetivo, as propriedades ligadas 
              à própria história da arte, etc.
              
                  Dentro deste contexto, a estratégia da 
              suspensão, por deslocar um corpo do chão para o ar, 
              torna evidente estas características. Nesta situação 
              as qualidades materiais do trabalho não só estão 
              explicitadas, como também jogam entre os limites de suas 
              capacidades físicas e visuais, redimensionando-as.
              
                   Seguindo esta direção, massa, 
              peso e volume, lidam com a possibilidade de transcender suas características 
              físicas em detrimento de aspectos visuais. Neste agenciamento 
              entre o que está dado e o que está sendo visto, são 
              as possibilidades de relação entre o espectador e 
              a obra que saem enriquecidas.
              
                  Portanto, é preciso deixar claro ainda 
              que as qualidades de massa, peso e volume, estão com certeza 
              ligadas a questões estruturais da escultura, por sua relação 
              dada diretamente no espaço, interligadas com a gravidade, 
              contudo, é óbvio que a escolha material só 
              é levada a cabo quando está em acordo com a lógica 
              interna do próprio trabalho. É possível reafirmar 
              então, a idéia complexa que ultrapassa estas qualidades, 
              posto que o peso pode ser mínimo, leve e ainda assim estamos 
              tratando de peso. O volume pode ser pouco, mas ainda é um 
              volume reduzido, da mesma forma com a massa. 
              
                  Digo isto porque em termos de discussão 
              poética, não vai ser o fato do trabalho ser leve ou 
              pesado, grande ou pequeno, compacto ou fluído, próximo 
              ou distante do chão, que irá definir o impacto que 
              este trabalho será capaz de causar, mas sim as articulações 
              propostas entre estes elementos e outros ainda possíveis.
              
                 Assim, o estranhamento está no fato do trabalho 
              não ter ligação com o chão, o que é 
              evidenciado através desta materialidade pulsante construindo 
              sentidos.
            
            Tempo
              
                Ao pensar em um trabalho suspenso fico me questionamento 
              o quanto o tempo está implicado nesta escolha, neste procedimento. 
              Aliás, um dos significados da própria palavra suspenso 
              é relativo a um tempo parado, adiado, paralelo. Diante disto, 
              ao pensar em um tempo relativo a um trabalho plástico suspenso, 
              não me refiro a um tempo marcado por minutos ou horas, mas 
              justamente aponto um tempo momentâneo, preso ao instante, 
              um contra-tempo.
              
                  Quando um trabalho ocupa um espaço que 
              está situado entre o teto e o chão, ou seja, um espaço 
              existente no meio, entre dois extremos, ele encontra-se como que 
              congelado neste espaço, pontuando um novo lugar, inusitado 
              para o ambiente, um espaço em que o tempo, graças 
              a uma postura iminente do próprio trabalho, parece estar 
              capturado. 
              
                  É possível pensar, a partir disto, 
              esta iminência como um tempo latente, anunciado desde o momento 
              em que o trabalho se coloca no espaço até a sua possível 
              queda, quando a gravidade ganharia este embate de forças. 
              Uma relação de transitoriedade apresenta bem esta 
              dinâmica temporal ligada a suspensão.
            
                 Faz-se necessário afirmar então, 
              que estes pontos, até aqui apresentados, não pretendem 
              de maneira nenhuma esgotar este assunto, até porque não 
              me parece que seja tão simples assim, esgotar um assunto 
              que lida com características possíveis de gerar outras 
              discussões, devido a sua estrutura complexa, capaz de articular 
              não só o trabalho e as suas partes, mas o espectador 
              e o próprio ambiente na sua multiplicidade.
              
              
               Sendo 
              assim, com a intenção de apenas "amarrar" 
              algumas idéias a respeito deste assunto - a estratégia 
              da suspensão - e na tentativa de estabelecer um diálogo 
              com estas observações, foram selecionados alguns trabalhos. 
              A propósito, foi a partir deles -os trabalhos - que o texto 
              foi escrito.
              
                  Para tanto, escolhi imagens de Waltercio Caldas, 
              Nelson Felix e Rivane Neuenschwander, todos artistas brasileiros.
              
                  A escolha destes artistas não 
              foi feita a esmo, na verdade, como curiosa tentei reunir trabalhos 
              que pontuassem três diferentes modos de lidar com a suspensão, 
              vendo-os, a partir destes trabalhos, também como três 
              maneiras de ativar o espaço, articulando aqueles aspectos 
              tratados anteriormente. (Nota 5)
              
                  É interessante perceber que a escolha 
              final restringiu-se a artistas brasileiros, ainda mais se for possível 
              pensar nas heranças deixadas pelas rupturas dadas no Neoconcretismo, 
              sobretudo no "[...] desejo neoconcreto de redefinir a operação-arte 
              e seu relacionamento com o espectador." (Brito, 1999:87)
              
                  De certa forma, sem sobretudo ter este pressuposto 
              como intenção, é possível dizer que 
              a estratégia da suspensão traz esta discussão 
              de maneira direta, por justamente lidar com um estranhamento, conforme 
              vimos anteriormente, entre o corpo do espectador e o corpo do trabalho, 
              um não reconhecimento capaz de intensificar esta relação. 
              Na verdade, me parece que as investigações neoconcretas, 
              permitiram a produção brasileira uma independência 
              ou ainda como Tadeu Chiarelli (idem:02) aponta: 
              
              O Neoconcretismo perdura junto a essas novas gerações 
              mais como um marco de qualidade e autonomia alcançado pela 
              arte local - útil para construção de uma auto-imagem 
              mais positiva do artista brasileiro contemporâneo - porém 
              sem muita influência direta na constituição 
              de suas poéticas.
              
                 Nas obras apresentadas aqui, há variações 
              quanto à natureza dos materiais, às quantidades, ao 
              uso repetido de formas ou não, ao volume de espaço 
              ocupado, à localização deste espaço 
              em relação ao ambiente, a altura deles em relação 
              ao chão, entre outras. 
              
                 Deste modo, é na perspectiva de tentar 
              esclarecer estes aspectos sob a condução dos exemplos 
              que deram impulso a este processo de investigação, 
              que as imagens serão comentadas.
            
                  Waltercio Caldas é citado aqui através 
              de dois trabalhos seus, Longínqua, 1986 e Duplo 
              sem título, 1989.